Cerca de 50 adolescentes e jovens alagoanos em conflito com a lei trocaram a penalidade do regime de internação pela oportunidade de se prepararem para a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que será realizada em dezembro para socioeducandos. Nesta terça-feira (18), as Promotorias de Justiça da Infância e da Juventude da Capital, em parceria com o SEB COC, promoveram um “aulão” de revisão no auditório do prédio-sede das Promotorias de Justiça da Capital com professores de história, geografia, biologia e física.

A iniciativa de oferecer uma experiência educativa mais dinâmica às vésperas da prova dos socioeducandos partiu da Diretoria de Educação da Superintendência de Assistência Socioeducativa, vinculada à Secretaria de Ressocialização e Inclusão Social (Seris), e contou com o apoio do Juizado da Infância e Juventude e da Defensoria Pública Estadual, além do próprio Ministério Público do Estado de Alagoas. A fim de facilitar o deslocamento dos adolescentes e jovens, o evento foi organizado em dois dias, sendo o primeiro realizado na segunda-feira.

Para os irmãos R. e R. C. L., o Enem valerá três anos de ensino médio e o acesso à universidade pública. Os gêmeos de 18 anos, que estudaram até a 9ª série e agora se encontram no regime de semiliberdade, sonham cursar Educação Física para se tornarem árbitros de futebol. “Sempre gostamos muito de futebol, por isso nossa vontade de seguir numa área que trabalhe com esporte. Na aula de física desta manhã, por exemplo, estudamos pressão e altitude, o que nos ajudou a entender como funciona a panela de pressão e os efeitos da altitude no jogador de futebol”, disse R.

Já a socioeducanda da Unidade de Internação Feminina, H. T., de 17 anos, quer ser médica neurocirurgiã e sabe que, antes de cursar Medicina, precisa passar pelo vestibular. “Todos que estão aqui reconhecem que erraram, têm consciência do mal cometido e entendem a pena a ser cumprida. Mas também todos aqui lidam diariamente com a paciência e a força de vontade necessárias para superar essa fase. Essas virtudes seguirão com a gente na busca por nossos sonhos. Agradeço às pessoas que acreditam e lutam por nós. Elas também nos motivam a seguir em frente”, falou a adolescente.

A diretora pedagógica da Superintendência de Assistência Socioeducativa, Elizabeth Kümmer, comemorou o número de socioeducandos interessados em fazer a prova do Enem. “Em 2012, foram apenas oito. No ano seguinte, o número subiu para 16, e, agora, temos 47 inscritos no exame. Momentos como os do aulão, por ser dinâmicos e lúdicos, fazem com que os estudantes gostem cada vez mais de estudar. Tivemos hoje uma oportunidade de tirar o socioeducando de dentro do ambiente de internação, mostrar-lhes que também são parte da sociedade e importantes para todos”, explicou.

Educação como caminho

Um dos maiores entusiastas do aulão, o promotor de Justiça da Infância e da Juventude da Capital, Rogério Paranhos, defende o cuidado com o adolescente e jovem em conflito com a lei com o objetivo de desenvolver uma política para a juventude das unidades de internação em que todos ganhem, socioeducandos, poder público e sociedade.

“Não é só a população que está insatisfeita com tantas rebeliões e manutenções de reclusão nos últimos meses. Os socioeducandos também estão desgastados com o quadro de violência nas unidades e, mais do que isso, prontos a receberem positivamente bons estímulos na área de educação, cultura, esporte. É preciso melhorar as condições de estudo nos prédios para que um bom estudante tenha a oportunidade de passar o máximo de tempo concentrado nos estudos. E não porque foi obrigado a fazê-lo, mas porque quer”, destaca o promotor.

Para a promotora Alexandra Beurlen, a iniciativa representa uma valorização dos socioeducandos como cidadãos. “É uma experiência pedagógica nova que assegura o direito dos adolescentes e jovens em conflito com a lei a terem acesso a uma socioeducação real. Acredito que essa medida pedagógica deva ter sequência”, disse Alexandra, que também é titular de uma Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude da Capital.

Foi a mistura da educação e do lúdico que ajudou o professor Edson Santos Júnior a envolver o público na revisão de física. “Não é porque algo começou errado que ela deve terminar errado. Digo a vocês, estudantes, que, se não der para passar nessa prova, na pior das hipóteses, ganhou-se a experiência para fazer melhor no ano que vem. Se apostarem no estudo não tem como dar errado porque o mundo é de quem estuda. Apostar no estudo é apostar em vocês”, motivou o docente.

Participaram dos dois dias de aulão socioeducandos da Unidade de Internação Masculina, Unidade de Internação Feminina e Unidades de Internação Masculina Extensão I e II, além dos adolescentes e jovens em conflito com a lei no regime de semi-liberdade. O colégio SEB COC disponibilizou para a preparação dos estudantes uma equipe de professores, material didático e camisas do próprio colégio.

Diante do trabalho desenvolvido pelos órgãos de segurança pública, a Secretaria Estadual de Educação também passou a apoiar a iniciativa e disponibilizará em breve simulados e aulas de revisão audiovisuais para os vestibulandos.