Novembro é o mês em que se celebra o Dia da Consciência Negra, data que traz à tona a discussão sobre as raízes do Brasil, formadas, em grande medida, pelos povos negro e indígena. Por mais de 300 anos, as pessoas pretas foram escravizadas e, até hoje, continuam sofrendo as marcas desse passado de sofrimento, principalmente no racismo, ainda tão presente no dia a dia. Para abordar como algumas famílias lidam com o assunto, e como pais e mães tratam do tema para melhor preparar seus filhos diante desse contexto, o Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL) lança, nesta terça-feira (18), a websérie “Raízes que Ensinam”.

A partir de hoje, serão publicados quatro vídeos nas redes sociais do MPAL que contam a história das famílias da ialorixá Mãe Neide e sua filha Naná Martins; da professora de Matemática Vanessa Ferreira e sua filha Cora Mariá; do fotógrafo Anderson Macena, o filho Orion e a sua mãe Genilda da Conceição Macena, reunindo três gerações da mesma família; além do professor de História Zezito de Araújo e suas duas filhas Kanama Emídio de Araújo e Narema Émidio de Araújo.

Os vídeos trazem os depoimentos de pais, mães e filhos contando como o comportamento antirracista é discutido em cada família desde a infância, de modo que os mais jovens possam lidar com a temática e enfrentar os desafios cotidianos que surgem ao longo da vida.

Racismo é crime

O Ministério Público alerta que a Lei nº 7.716/1989 pune os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional com pena de 2 a 5 anos de reclusão e multa. Além disso, em 2023, o Governo Federal promulgou a Lei n.º 14.532/2023, que equipara a injúria racial ao crime de racismo. De forma prática, a Lei tipifica como racismo a injúria racial, endurecendo a punição.

A mudança, segundo especialistas, aprofunda a ação de enfrentamento ao racismo, estabelecendo, por exemplo, que a agressão a atletas, juízes, torcedores e torcidas, em um ambiente de prática de esportes, seja compreendida como racismo esportivo. O deboche ou as piadas ofensivas disfarçadas de humor caracterizam o racismo recreativo. O preconceito e a desqualificação das religiões afrobrasileiras são racismo religioso.

O trabalho do MPAL

No âmbito de suas atribuições, o Ministério Público do Estado de Alagoas tem adotado diversas providências para o enfrentamento ao preconceito e ao racismo contra o povo negro, especialmente com ações coordenadas pela Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, que busca garantir a efetivação de políticas públicas já estabelecidas, mas que, em muitas situações, não são respeitadas, bem como assegurar a implementação de novas políticas, onde necessárias.

De acordo com a promotora titular da área, Alexandra Beurlen, uma das medidas foi uma Ação Civil Pública (ACP) para assegurar o cumprimento da Meta 8 (Equidade na Educação) do Plano Estadual de Educação (PEE), pedindo aumento do valor do Cartão Escola 10 para alunos autodeclarados negros.

“Também entramos com ACP para garantir a implementação e funcionamento do Conselho de Igualdade Racial no município de Maceió. Em outro momento, recomendamos, e foi acatada (a vigorar em 2026), a implementação de reserva de vagas étnico-raciais para graduação da UNEAL e da UNCISAL, ambas universidades públicas estaduais, que não cumpriam adequadamente a política de cotas”, lembrou a promotora de Justiça Alexandra Beurlen.

Ela também destacou que em outubro foi realizada uma audiência pública, na sede do próprio MPAL, em Maceió, sobre a política de saúde integral da população negra. Como resultado das discussões e dos problemas levantados, o MPAL está elaborando recomendação para o município e para o Estado.

“Aprovamos, no Colégio de Procuradores, a Proposta de Implantação do Programa MP Antirracista, com várias etapas, desde o letramento de membros de servidores, até a criação de protocolo antirracista”, adiantou a promotora, ao citar uma medida estrutural de curto, médio e longo prazo que será desenvolvida no âmbito do MPAL e que, dessa forma, pretende qualificar e melhorar o serviço ofertado pelo ente ministerial à população alagoana.

Dados confirmam desigualdade

Dados do IBGE confirmam o quanto as ações do Ministério Público ainda são necessárias para garantir o acesso a políticas públicas, tendo em vista a discrepância de oportunidades entre pessoas pretas e pardas e pessoas brancas.

Segundo dados da Síntese de Indicadores Sociais 2023, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), enquanto os pretos e pardos representavam 55,7% da população em 2022, a proporção deste grupo entre todos os brasileiros abaixo da linha de pobreza era de 70,3%, ante a fração de brancos de 28,7%. Em relação aos números de extrema pobreza, a discrepância fica ainda maior: 73% eram negros e 26% brancos.

De acordo com a edição 2023 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua Educação), também do IIBGE, a taxa de analfabetismo entre pretos e pardos de 15 anos ou mais caiu em 2023 para 7,1%, o menor nível histórico desde 2016, mas ainda é mais do que o dobro da registrada entre brancos, que é de 3,2%.

De 2016 para 2023, a taxa de analfabetismo entre as pessoas pretas ou pardas na faixa etária indicada recuou 2 p.p. no país. É a primeira vez que o indicador ficou próximo de 7%. Porém, em 2023, dos jovens de 14 a 29 anos que não completaram o ensino médio, 71,6% eram negros e apenas 27,4% eram brancos.